Maníaco do Parque é mesmo uma perda de tempo?
Até onde a arte pode ir ao revisitar histórias reais de violência? Maníaco do Parque, um dos mais novos lançamentos da Amazon Prime Video, tem dividido opiniões desde a sua estreia e tenta responder essa questão.
Muitos vêm criticando sua suposta falta de propósito e as escolhas que cometeu. Embora eu entenda parte desses posicionamentos, acredito que vale a pena assistir para ter sua própria opinião, e vou te explicar o porquê ao longo dessa crítica.
Entendendo as críticas e proposta
Em primeiro lugar, tenho a percepção de que parte dessas críticas vem de um entendimento errado sobre a proposta do filme. Desde o início do seu desenvolvimento, a ideia era traçar um enredo, ainda que em parte fictício, que colocasse Francisco como antagonista e não protagonista dessa história.
Exatamente para fugir da representação problemática e infelizmente comum em produtos de true crime.
“Nosso objetivo neste filme foi fazer da Elena a protagonista, enquanto que o Francisco é o antagonista. O título é “Maníaco do Parque”, mas é bom que as pessoas se surpreendam com quem de fato conduz essa história, é uma mulher. (…) Na época dos crimes, vimos mais uma culpabilização das vítimas do que um acolhimento, então foi uma preocupação mudar isso.” — Declarou Silvero Pereira durante entrevista ao jornal O Globo.
Nesse sentido, a narrativa ganha uma protagonista fictícia. Elena (Giovanna Grigio) é uma repórter iniciante do infame Notícia Populares, que ainda está tentando encontrar sua voz no jornalismo. Confusa entre suas próprias opiniões e com o sensacionalismo que é pressionada a perseguir, vemos essa personagem descobrir seu propósito enquanto investiga esses crimes.
Ainda que ambas as tramas aconteçam paralelamente, quem conduz é Elena e não o assassino. Embora o enredo pudesse ser melhor desenvolvido, o filme se destaca por essa escolha. O assassino, conhecido como Maníaco do Parque, é acusado de atacar o total de vinte e uma mulheres e assassinar dez delas.
Após tamanhas brutalidades e toda atenção sensacionalista da mídia na época, o filme cumpre seu propósito de refletir sobre a ética jornalística e até que ponto pode se ir por um clique. Considerando o contexto atual de fake news, o tema se torna ainda mais relevante.
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Quais são os outros destaques do longa-metragem?
Com um bom ritmo, o novo filme da Amazon Prime consegue conquistar os mais abertos a proposta. Nessa obra, o assassino não é um monstro, ou alguém extremamente poderoso.
Ele é retratado como aquilo que de fato é: um homem comum, sem brilho ou mistério. Não há glamour no mal que ele causa, apenas uma mediocridade e crueldade desconcertante. Essa escolha torna a narrativa ainda mais interessante, por ir contra a tendência de fetichização de criminosos.
Outro ponto de elogio são as atuações, especialmente a de Giovanna Grigio, é marcada por um desconforto latente que parece sempre prestes a transbordar. Sua interpretação traz nuances emocionais interessantes para a trama, principalmente na cena da entrevista, onde ela alcança o clímax do seu ódio a tudo que Francisco fez as vítimas. Demostrando a dificuldade que mulheres enfrentaram em uma época em que o feminicídio era muitas vezes supostamente justificável.
Embora algumas atitudes da personagem possam soar incoerentes para o contexto do século XX, essa escolha parece intencional, reforçando a proposta do filme como uma releitura contemporânea. Então, não considero um problema, porém, isso pode gerar incômodo para quem busca esse tipo de precisão.
A violência, por sua vez, é tratada de maneira sútil. Ainda que o filme deixe claro a brutalidade e tenha algumas cenas fortes e difíceis de ver, o longa não vai além do necessário. São poucas os momentos explícitos e, mesmo neles, o foco da direção não está na impetuosidade, mas no que acontece ao redor. Essa decisão condiz com o restante da proposta e mostra respeito às vítimas dentro do possível.
Qual o papel do jornalismo na narrativa?
Peça fundamental na construção dessa obra. A trama se mostra tão interessada no impacto dos crimes quanto na importância de relatar casos como esse de forma ética. A violência não é o espetáculo: o holofote está na maneira como a imprensa pode construir ou redimir uma narrativa.
Essa dualidade aparece bem sobretudo nas sequências da redação, a relação de Elena com jornalistas homens mostra isso muito bem. Com um roteiro mediano, Maníaco do Parque constrói uma obra que não busca celebrar a violência, mas sim questionar como a narrativa sobre ela é contada — e por quem.
Por último, quero deixar elogios à direção de Maurício Eça, que acerta precisamente na escolha dos ângulos, em especial na entrevista entre Francisco e Elena. A câmera capta perfeitamente a mudança sutil de poder ao longo da conversa.
No começo, o assassino parece comandar a narrativa, como se fosse o dono daquela história. Mas, conforme a entrevista avança, é Elena quem assume o controle, mostrando que a perspectiva dele nessa história não podia ser menos importante.
Então, por que as críticas?
Apesar da proposta ser bem-intencionada, não precisa ser um espectador muito experiente para perceber que o longa comete erros relevantes, que atrapalham a experiência de quem assiste.
Em primeiro lugar, o Maníaco do Parque peca pela falta de profundidade na vida de Elena fora do caso e na história das próprias vítimas, que aparecem com maior relevância só no último ato. Apesar de acreditar que essa escolha tenha sido motivada por restrições de tempo e montagem, isso não suaviza o problema do espectador. O filme precisava de mais camadas, mais tempo ou diferentes escolhas, para que a história conseguisse ser mais envolvente e realmente um tributo digno às vítimas.
Inclusive, essa tentativa de dar voz às vítimas no terceiro ato é admirável, porém infelizmente acaba soando forçada. O ritmo apressado do final compromete o impacto que poderia ter sido alcançado se a narrativa tivesse dedicado mais tempo às histórias das mulheres afetadas. Mesmo que fossem histórias e nomes fictícios, elas dariam uma nuance maior ao enredo.
Outro ponto que vale menção é a interpretação de Silvero Pereira. Ainda que seja, no geral, muito boa, ela peca pelo excesso em alguns momentos, especialmente nas cenas em que ele expressa raiva. Sua performance intensa não combina com as descrições apresentadas pela personagem de Mel Lisboa, quando descreve o transtorno que esse tipo de criminoso possui.
Se essas cenas não poderiam ser alteradas ou retiradas para não atrapalhar a presença pequena de Mel Lisboa, Maurício Eça deveria ter dirigido melhor o ator para que sua interpretação se adequasse melhor a elas. Do jeito que vemos, é só confuso e incoerente.
Com isso, chega a hora de encerrar a crítica e declarar minha opinião após pesar todos esses pontos.
Mas, qual é o veredito?
Enfim, Maníaco do Parque entrega uma história competente e interessante de se ver. O filme é um passo na direção certa para o true crime nacional. Apesar das falhas narrativas, a proposta pode influenciar muitos títulos nessa cena daqui para frente com sua perspectiva mais ética do universo do crime. Por isso, na minha visão, vale a pena conferir!
E você, o que achou? Concorda com as críticas ou encontrou algo que te surpreendeu positivamente? Me conta nos comentários!