Habemus What If…? | Será o Destino ou o Livre-Arbítrio?
A série What If…? é uma daquelas coisas que, sinceramente, você não espera acabar para tentar entender como começou. Ou melhor, quando e “se” começou. Parece confuso, mas com o passar do tempo (se é que existe), inevitavelmente, buscamos pela nossa essência, nossa origem, quem realmente somos. Em outras palavras, qual a parcela do destino ou do livre-arbítrio em nossas escolhas pessoais?
A série foi uma sacada certeira da Marvel no sentido de, primeiramente, explorar as inúmeras possibilidades do que poderia ser, porém não foi (ou o que poderia ter sido). Segundo que, por mais difícil de aceitar do que pareça, existe uma natureza, um propósito, uma alma dentro de nós, que conduz para o que verdadeiramente somos.
Apesar de tanta energia psíquica empregada numa vontade, o instinto às vezes fala mais alto, e trilha um caminho talvez já escolhido sem que a própria consciência se dê conta. Enfim, a série nem acabou e já despertou infinitas vontades de escrever.
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Destinos “Paralelos”
Imagine que um personagem já conhecido ou famoso, de repente, tem um outra jornada traçada por meio de uma nova narrativa. Além disso, um cenário bem conhecido e familiar, mas que move as peças numa nova jogada, tal qual um jogo de xadrez. Em suma, essa é a premissa da série What If…?: temos a falsa certeza de que já vimos aquela cena ou aquela pessoa antes, fazendo coisas e escolhas parecidas, porém de uma maneira diferente e com resultados mais ou menos distintos. As palavras-chave aqui são memória afetiva e desapego.
Assim, a cada novo episódio, narrado pelo Vigia (uma espécie de narrador consciente), o espectador é convidado a encarar um novo lado, uma nova probabilidade dentre as infinitas que o universo (ou multiverso) pode oferecer. Entretanto, não se engane: nada é exatamente o que se mostra, apesar do rio sempre encontrar o caminho do mar.
Dessa maneira, alguns personagens ganham diferentes ou inéditos protagonismos; outros, como em qualquer jogo de dados, apostam tudo e decidem fazer o que precisa ser feito. Ao final, por enquanto, tudo se encaminha para a nova/velha sobreposição de narrativas.
“Seu destino é determinado por sua natureza, ou pela natureza do seu mundo?”
O Vigia.
Confira Os principais easter eggs do sexto episódio de What If…?
Jung e o Livre-Arbítrio
Para variar, Jung correu para que a gente caminhasse. Ele nos mostra, por meio da Psicologia Analítica, que todos são vítimas e guiados por seus inconscientes (sejam pessoais ou coletivos) e isso é uma eterna roda de repetições. A consciência, ao contrário, é finita, filha e escrava do tempo e espaço, que não são nada lineares ou únicos.
Ademais, nos apresenta uma importante reflexão: tudo, absolutamente tudo na vida é feito de contrários, de opostos, a famosa alteridade. São as antinomias: para cada luz, há uma sombra correspondente; para cada boa ação, uma tentativa de inércia e mau uso do poder; para cada ser que se autor realiza, um que se mantém na normose.
Além disso, o grande psicólogo do século XX nos deixou outra lição fundamental: cada Self — o Si-Mesmo — (a nossa verdadeira essência) pertence a algo maior, a uma continuidade que supera a compreensão humana. Significa dizer que é melhor deixar o fluxo seguir naturalmente, sem interferências, sem muitas repressões ou tentativas de bloqueio.
Versões Alternativas, Mesmos Propósitos
Na série What If… ?, é muito claro observar essa reflexão acerca das diferentes “versões”: ao invés de Steve Rogers, Peggy Carter se torna a heroína que acaba com a guerra, apesar de ainda sofrer com o machismo estrutural. T’Challa, filho de Wakanda, é escolhido (por acaso?) para se tornar o Senhor das Estrelas, mas seu destino continua atrelado ao passado e à infância.
O titã louco segue com sua sina de defender o indefensável, porém, desta vez, apenas como uma ideia persistente. Wanda e Visão estão conectados para sempre e o peso do luto faz com que ambos não consigam se desapegar um do outro. Mexer com o reino quântico pode ser a saída, ou pode se tornar o inferno para uma perda irreparável. E o Dr. Estranho? A linha tênue entre bem e mal parece ser invisível, principalmente quando estamos obcecados pelo poder.
As diferentes linhas do tempo mostram alternativas para as histórias já contadas, mas a essência de cada personagem parece ser eterna. Os ditos “ponto absoluto” que não podem ser alterados. Desse modo, como num grande teatro, a vida se encarrega de nos oferecer vários papéis para interpretarmos, mas, em algum momento, vamos encontrar o nosso protagonismo e a obra-prima na qual imprimimos a nossa marca.
Liberdade ou Linha Temporal?
Bom, não me arriscaria a dizer se uma coisa ou outra, talvez uma coisa e outra; uma coisa depois a outra; uma coisa, se a outra. A inútil tentativa de fugir de nós mesmos é a mais antiga das estratégias dos seres humanos. Porém, quem realmente se dispõe a assumir a bronca de seu mundo interior, com suas coerências e incoerências, virtudes e defeitos, expansões e retrações? Mais fácil (porém, não menos complicado) compreender o que cada chama interna nos convida a experimentar.
Enfim, que tal usarmos nossa energia vital no percurso e na busca pelo desconhecido, mas sem deixar de ouvir a Grande Voz Interna?
Vinícius de Lacerda é formado em Letras e professor de língua portuguesa. Atualmente, é pós-graduando em Psicologia Junguiana, poeta, compositor, redator e entusiasta da Cultura Pop.
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